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SOBRE A ARTE

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Movimento surrealista continua a influenciar artistas brasileiros


'Sorvete', de Rafael Silveira, simboliza os conceitos de urgência e contemplação

'Sorvete', de Rafael Silveira, simboliza os conceitos de urgência e contemplação

Em 1924, na França, o surrealismo florescia junto às vanguardas europeias. André Breton, Salvador Dalí e René Magritte são alguns dos nomes evidenciados do movimento que, agarrado à complexidade e devaneios inconscientes, rejeitava os padrões burgueses e a tradução literal de sentimentos nas obras. Duas décadas depois, ao fim da Segunda Guerra Mundial, perdeu força para o expressionismo e, apesar de alguns artistas prosseguirem com conceitos surrealistas, a corrente teve o fim declarado. Ainda hoje, artistas contemporâneos persistem nas influências da tendência de mais de noventa anos atrás.


“Quando a arte não é óbvia, ela gera questões e força a mente humana a trabalhar”, afirma Nelson Maravalhas, pintor e professor de arte da Universidade de Brasília (UnB). “A arte óbvia não faz as pessoas pensarem e é quase um bem de consumo, enquanto obras mais complexas recebem um ‘não gostei’ do público, que muitas vezes quer dizer, na verdade, ‘não entendi’”, contrapõe o artista, que investe em obras que chama de concepções alegóricas.


Apesar do surrealismo ser um movimento findo, Maravalhas conta que é comum confundirem as técnicas dele com as dos artistas da década de 1920, e o mesmo acontece com outros contemporâneos. O curitibano Rafael Silveira, que levou mais de 90 mil pessoas ao Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, até o mês passado, não define o estilo das obras que cria, mas conta que, assim como as de surrealistas, elas surgem a partir do inconsciente. “O público, às vezes, dá leituras para as obras que são muito interessantes, e as minhas têm abertura para isso porque são como um sonho que você interpreta”, afirma.


A artista Nah Singh — ou Singh Bean, como assina — representa, por meio de colagens, a ancestralidade sírio-libanesa do pai e indiana da mãe, a espiritualidade, os direitos animais e as minorias. Nascida em São Paulo e radicada em Praga, Nah também afirma que o inconsciente é responsável por grande parte de suas produções, e explica: “Minha arte é espontânea. Muitos artistas fazem colagens para ser algo bonito e mostrar o brilho do mundo, o que eu não critico, mas, nos meus trabalhos, quero contar a minha história”.


Obras de mensagens completamente metafóricas e, às vezes, difíceis de entender, ainda que representem situações aparentemente impossíveis, costumam ter propósitos claros. Mesmo misturando partes de elementos diferentes para formar seres e objetos fora da realidade, as criações não são “sem pé nem cabeça”.


Maravalhas conta que, apesar de não ter um único tema expresso nas obras, descreve mensagens e questões psicológicas e políticas nas telas. Singh resume: “No fim das contas, eu só quero extravasar o que sinto”.


O curitibano Rafael utiliza Sorvete para explicar o significado por trás da arte que assina. A obra é uma instalação de 13 metros e de longe parece uma casquinha de sorvete comum, caída no chão e derretida, que se apresenta no formato de um sofá. “Gosto de usar o sorvete como analogia visual do efêmero na condição humana”, explica.


Olhando de perto, é possível ver que o que derrete da casquinha possui olhos e ossos humanos, além de morangos com formato de coração, o que Rafael aponta como uma quebra lúdica da obra. O artista traduz a mensagem que deseja passar com a instalação: “O conceito aborda a questão da urgência versus a contemplação. O que é urgente? Parar e contemplar a vida pode ser urgente? São questões filosóficas da intimidade psíquica”.


Nelson Maravalhas (à esquerda, com 'Complexo de Jonas') e Singh Bean (à direita, com 'Reencarnação') criam obras a partir do inconsciente

Nelson Maravalhas (à esquerda, com 'Complexo de Jonas') e Singh Bean (à direita, com 'Reencarnação')

criam obras a partir do inconsciente


As “inspirações”


Nelson Maravalhas faz trabalhos baseados em estudos de outsider art. “A semelhança entre minhas obras e obras surrealistas pode ser justificada pelos meus estudos em outsider art, a arte dos marginalizados, que é uma das correntes que impulsionou o surrealismo.”


Singh Bean afirma: “admiro artistas como a Leonora Carrigton, pintora surrealista que tem obras de situações que não existem, mas que no meu inconsciente e no meu mundo místico fazem muito sentido”.


Rafael Silveira conta que, entre os artistas de quem recebeu influências durante o desenvolvimento de trabalhos, estão os surrealistas René Magritte e Salvador Dalí, além de Giuseppe Arcimboldo, que tem também obras comparadas ao movimento artístico.

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