Cubismo: o apetite dos tempos
Sem manifestos, o movimento adaptou as revoluções à fruição.
Tudo na arte moderna começou por Paul Cézanne. Não à toa seu Les Grandes Baigneuses, realizado entre 1900 e 1906, acendeu a chama das revoluções no início do século XX. Era o quadro dos quadros, pelo pintor dos pintores. Pablo Picasso elegeu Cézanne um mentor mais do que aos impressionistas ou a um contemporâneo como Henri Matisse. E se assumirmos a crença de Serge Fauchereau, o autor de O Cubismo, uma Revolução Estética, sobre as origens do movimento, entenderemos o porquê de Les Demoiselles d’Avignon apresentar-se como um marco inicial. O intuito da obra composta pelo espanhol em 1907 parecia ser o de reconstruir aquele pioneiro segundo o apetite dos tempos.
“Na origem de tudo está o contato com Cézanne”, escreveu Georges Braque, um dos maiores nomes do movimento, de quem Picasso parece ter aprendido tantas lições, e um de seus grandes pensadores. “Ele foi muito mais que uma influência, uma iniciação. Cézanne, o primeiro, havia rompido com a perspectiva erudita, mecanizada, que fora praticada pelos artistas durante séculos.” Nesse ensaio, como observa seu autor, estudam-se as origens do cubismo, embora elas se confundam. Fauchereau não comenta a ideia do historiador Giulio Carlo Argan segundo a qual o movimento adaptara à fruição contemplativa as novas perspectivas da arte. Sua natureza seria essencialmente burguesa, contra aquela do experimento sensorial, revolucionária, de um Miró ou de um Kandinsky.
Até pela capacidade de intensa assimilação, o cubismo, segundo lembra o historiador, espraiou-se a outros desenvolvimentos da arte ocidental. Foi capaz de andar pela poesia, como pelo cinema. Pela arte decorativa, como pela colagem. Exerceu-se em publicações. Mas jamais expôs claramente seus ideais. Ao contrário de tantos movimentos de época, não se submeteu à necessidade de um manifesto. E, sem nada explicar, amplificou seu mistério.