Musical repassa a trajetória de Ney Matogrosso em 24 canções
Uma trajetória contada em 24 canções: a tarefa, que pode parecer difícil, se torna ainda mais dura se a história a ser narrada é a de Ney Matogrosso. Dono de uma das mais luminosas carreiras da música brasileira, o artista é tema do musical "Puro Ney", que estreiou 22 de agosto, no Teatro dos Quatro.
Concebido por Cinthya Graber, amiga de longa data de Ney, o espetáculo perpassa as mais de quatro décadas de carreira do cantor, destacando nas canções as marcas que desde sempre o consagraram, como a liberdade, a transgressão e a honestidade. Mas, para o próprio Ney Matogrosso, é "muito difícil" se imaginar recebendo homenagens.
"Não me considero uma pessoa 'homenageável', então essas ideias até me assustam um pouco. Foi assim com o Zé [Maurício Machline] também", diz o artista, abusando da modéstia e citando a outra homenagem que recebeu este ano, no Prêmio da Música Brasileira.
Em "Puro Ney", o homenageado dará o ar da graça de maneira indireta - Ney aparecerá em imagens projetadas no fundo do palco, enquanto Marcos Sacramento e Soraya Ravenle, acompanhados por uma banda, interpretam as músicas. Segundo Luís Filipe de Lima, diretor e roteirista do espetáculo, o principal critério foi o de selecionar canções em que Ney tenha deixado sua assinatura como intérprete.
"Todas as músicas apresentadas foram lançadas por Ney, ou receberam dele a versão definitiva. Por isso não incluímos no roteiro nenhuma das músicas do Cartola, que ele gravou lindamente, mas que não eram inéditas para o públco, por exemplo", explica Lima, que tem ainda uma identificação pessoal com o artista homenageado: "'O Vira', lançada pelo Secos e Molhados, foi a primeira música que tirei no violão, aos 7 anos de idade".
Ney conta que não interferiu na concepção do espetáculo, mas fez questão de que um de seus maiores sucessos, "Rosa de Hiroshima", fizesse parte do roteiro - "Infelizmente, ela é mais atual hoje do que quando foi gravada, com esses loucos se ameaçando com bombas atômicas e botando em risco o mundo todo" - e de que outro, "Telma, eu não sou gay", não fosse incluída. Ele explica:
"Eu gravei 'Telma' como uma grande brincadeira, para um disco do João Penca & Seus Miquinhos Amestrados que era só de paródias. Só que fez muito sucesso e a gravadora forçou a barra para que a música fosse incluída no meu disco. Era isso ou o disco dos Miquinhos seria recolhido das lojas. Foi a única vez que cedi a uma chantagem, mas depois risquei a música do meu repertório".
Cantores de sólidas carreiras, com participações em diversos musicais, Soraya Ravenle e Marcos Sacramento contaram ao G1 que aceitaram o convite para "Puro Ney" sem pestanejar. "Quando vi o Ney com o Secos e Molhados, no início dos anos 70, a identificação foi imediata. Estou nervoso por tentar reler uma obra de tanta qualidade como a dele", diz Marcos.
"Nas gravações das imagens que serão projetadas durante o espetáculo, o Ney disse uma coisa que eu trouxe para o trabalho: 'Não se contentem comigo: sejam!'. Acho que isso é a principal marca dele, a de ser ele mesmo, sempre, e de ter se tornado um dos maiores artistas do Brasil, derrubando várias barreiras no caminho", afirma Soraya.