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SOBRE A ARTE

SOBRE A ARTE

Arte que não viaja


Depois de um tour internacional que passou por Japão, Estados Unidos e Itália, o famoso quadro “Garota com Brinco de Pérola”, de Johannes Vermeer, voltou à sua casa, na Holanda, terra natal do pintor. Desta vez, para sempre. De agora em diante, a obra ficará confinada ao Mauritshuis, em Haia, porque centenas de turistas visitam o museu todos os dias só para vê-la. Mestre do século de ouro holandês, Vermeer foi um artista obscuro em seu próprio tempo – suas pinceladas só ficaram conhecidas no começo do século XX. A fama de “Garota com Brinco de Pérola”, porém, aumentou muito quando, em 1999, Tracy Chevalier escreveu um romance sobre a moça e a publicação acabou inspirando um filme de 2004, estrelado por Scarlett Johansson. Apesar de os cineastas não serem historicamente precisos (ninguém sabe quem era a menina retratada nem se ela foi amante de Vermeer, como a ficção retrata), a obra cinematográfica conferiu enorme popularidade ao quadro, conhecido como a “Mona Lisa do Norte”, e filas cada vez maiores foram se criando por onde passou. Agora, essa multidão deverá se concentrar em Haia.


Com isso, “Garota com Brinco de Pérola” se une a outras obras impedidas de viajar, por motivos de preservação ou financeiros. Exposta no Louvre, em Paris, a Mona Lisa de Leonardo da Vinci não pode ser emprestada porque foi pintada em madeira e é sensível a mudanças climáticas. No entanto, é claro que o fato de ser um chamariz de público é determinante. O próprio museu francês admite que não pode decepcionar seus 9,3 milhões de visitantes anuais, dois terços deles compostos por estrangeiros que estarão em suas galerias uma única vez na vida e querem ver o quadro mais célebre do Renascimento. No Louvre também está a “Vitória de Samotrácia”, estátua grega do século 2 a.C. que retrata Nice, outra preciosidade que só pode ser apreciada in loco devido ao seu peso, o que dificulta os deslocamentos. Nem para ser restaurada ela deixou o museu. Foram dez anos de planejamento somente para a escultura de 5,7 metros e 30 toneladas ser transportada para outra sala. “O maior receio é com a conservação. Mas é claro que tem o lado econômico também. Que galeria quer perder sua obra-prima?”, pergunta Angelo Oswaldo, presidente do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), do Ministério da Cultura.

O tamanho também é um problema no caso de “Guernica”, a colossal tela modernista de Pablo Picasso sobre os horrores da Guerra Civil Espanhola. Com 3,5 metros de altura e 7,8 de largura, a pintura precisava ser enrolada para viajar a exposições em outros locais, prática hoje considerada arriscada por museólogos. Um dos 39 lugares que receberam o quadro foi a 2ª Bienal de São Paulo, entre dezembro de 1953 e fevereiro de 54. Foi o próprio Picasso quem pediu que ela não fosse mais emprestada devido aos óbvios danos que havia sofrido. Já “Os Jogadores de Cartas”, do pós-impressionista Paul Cézanne, está confinado à Fundação Barnes, na Filadélfia (EUA), criada pelo colecionador Albert Barnes. Ele proibiu que os trabalhos expostos ali fossem emprestados ou mesmo que sua disposição fosse alterada no museu, por ver seu acervo como um conjunto inseparável. Além de 69 Cézannes, a fundação possui 181 Renoirs, 59 Matisses, 46 Picassos e sete Van Goghs, entre outros.


No Brasil, medidas tão drásticas ainda não foram adotadas pelos mais importantes museus do País. No Museu de Arte de São Paulo (Masp) as obras pintadas sobre madeira viajam muito pouco porque o material sofre forte ação de variações na temperatura. É o caso de “Ressurreição de Cristo”, de Rafael, feito na virada do século XIV para o XV. Algumas saem do País só sob condições muito especiais. Foi o que ocorreu com “São Jerônimo Penitente no Deserto”, de Andrea Mantegna, exposta no Louvre para uma mostra sobre o renascentista italiano. A condição para empréstimo era de que fosse restaurada pelos profissionais do museu de Paris, já que a recuperação de uma obra desse tipo pode custar até US$ 500 mil.

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